top of page

A BUSCA PELA CURA

Entre cuidado, escuta e presença, a Cura Records celebra um ano de trajetória e dá início a um novo capítulo com o Healing


Foto: Guilherme Dezone
Foto: Guilherme Dezone

Vivemos em tempos de ruído constante. A pressão por produtividade, o excesso de informações e o cansaço emocional tornaram o equilíbrio quase um luxo.


Neste contexto, a música eletrônica se transforma em um espaço de pausa e reconexão, um ambiente de imersão sensorial, onde a batida é sentida no corpo e a melodia permite um desligamento momentâneo do mundo exterior.


Mas o que acontece quando o mesmo ambiente começa a reproduzir as pressões do mundo lá fora?


É justamente neste ponto que a Cura Records, idealizada pelos DJs e produtores curitibanos Masaaki e NeoClassic, encontra seu verdadeiro sentido: o de transformar a pista em um local de acolhimento.


A trajetória de Masaaki reflete bem esta busca. Entre a sensação de não pertencimento na faculdade e os anos tentando se firmar em uma cena musical competitiva, ele viveu de perto as incertezas da carreira artística. No esforço de equilibrar a expressão pessoal com as exigências do mercado, chegou a um ponto de exaustão, especialmente durante a pandemia, quando até pensou em desistir da sua carreira como produtor.


Foi assim que percebeu algo que atravessava artistas de diferentes níveis, o esgotamento criativo.

Relatos públicos de Burnout envolvendo DJs e produtores já consolidados da cena, ajudaram a tornar esse cenário mais evidente e contribuíram para a reflexão que daria origem à Cura Records, nascida da vontade de repensar o ritmo e criar um espaço onde a arte pudesse existir de forma mais saudável.


"A música cura as pessoas que escutam, mas quem cura quem cria a música?"


A pergunta passou a orientar o projeto, transformando a iniciativa em uma comunidade de cuidado e troca.

O nome, aliás, surgiu de forma orgânica. "Encaixou... foi a primeira coisa. Na primeira reunião já veio o nome", conta Masaaki.

Ele explica que a escolha foi natural, já que o público frequentemente associava as produções de NeoClassic a algo terapêutico.


Hoje, a Cura Records busca criar um meio em que o processo criativo seja leve, com produções que contam histórias e transformam emoções em som.


É a partir desse olhar que a gravadora se conecta a artistas como Daio Ruan, que lançou o EP Tokyo Girl pelo selo. Para ele, essa relação vai além da música enquanto produto.


"A Cura representa sentimento total. E é algo que eu levo muito em consideração em qualquer música. Se não há sentimento, não há música."


Este conceito não permanece apenas no discurso. Ele se traduz na prática por meio das Cura Sessions, eventos gratuitos realizados ao ar livre, como a Mercadoteca do Batel. Ao ocupar a cidade durante o dia, a gravadora cria um ambiente acessível e inclusivo, ampliando o alcance da experiência musical. Nas edições de agosto e setembro, essa proposta refletiu na diversidade do público, desde crianças e idosos até pets, que compartilharam o momento e reforçaram a ideia de convivência, escuta e pertencimento.


É no contato direto entre artistas e público que o conceito ganha forma concreta.


"Foi sensacional. Me conectar com pessoas que nunca antes tinha visto e tudo isso através da música", relembra Daio sobre tocar na primeira edição. "O que mais me marcou foi quando toquei uma faixa do duo Tinlicker, Let Me Go. O break deu um respiro para a pista e elas gritaram em êxtase. Tive a certeza que me conectei com aquelas pessoas."


A experiência relatada pelo DJ também reflete no olhar do público.


Stephanie Sikora, 25 anos, destaca como a proposta amplia o olhar sobre a cena e rompe com os estigmas que ainda cercam o gênero:

"Eu acho que a Cura representa um novo jeito de enxergar a música eletrônica, mostrando que a cena vai além do estereótipo criado pelo imaginário popular, de que as pessoas vão até eventos eletrônicos para usar drogas. Durante o evento deu para ver diferentes públicos aproveitando a música eletrônica num espaço gratuito e acessível, uma ideia maravilhosa."

Já Ingrith Cordeiro, 30 anos, encontrou no evento uma nova forma de lazer:

"Fui sem nem saber que tava rolando e adorei a vibe! Achei o rolê super legal e diferente, curti muito essa ideia de ser durante o dia, pra aproveitar com os amigos, tomar uns drinks e ouvir uma música boa sem aquela pegada de balada. Uma opção leve e divertida pra curtir o dia!"

A quebra de estigmas mencionada por Stephanie e a energia descontraída destacada por Ingrith não são casos isolados. Eles se alinham a um movimento que marcou a cidade pelas mãos de um dos grandes nomes do cenário nacional: o DJ e produtor catarinense ZAC.


O Pré-Warung Day passou pelo Parque Barigui em 2024 e retornou em 2025 para ocupar a Olaria do Parque. A edição mais recente promoveu a união entre ZAC, os fundadores da Cura, Masaaki e NeoClassic, e a Radiola Records, representada por Albuquerque, complementando o line-up ao lado de Rivkah e Foletto. O formato gratuito remete aos pré-carnavais eletrônicos de 2015 e 2016 na Avenida Marechal Deodoro e reforça a democratização do acesso ao gênero, reafirmando que a cultura eletrônica também pertence à rua.


Assista ao set completo de Masaaki e NeoClassic gravado ao vivo no Parque Barigui durante o Pré-Warung Day 2025.

Masaaki menciona que, embora os eventos do parque não tenham a assinatura da Cura, uma futura parceria com ZAC neste formato é uma possibilidade — um encontro entre iniciativas que compartilham o mesmo espírito. No fim das contas, ambas mostram que Curitiba está mais do que pronta para esta abordagem.


E o resultado direto desta mentalidade é uma cultura de inclusão que desloca o foco da performance social para a vivência coletiva. "A gente quer proporcionar o momento para que as pessoas consigam curtir e viver ali tranquilamente, e estar, conversar, interagir, dar risada", explica Masaaki. É um ambiente onde o público está entregue à experiência, não ao status.


O projeto também se posiciona diante de um paradoxo da cena curitibana, onde mesmo com um público historicamente consolidado, talvez nunca se tenha escutado a música com tão pouca atenção. Em uma era dominada pela cultura do “ver e ser visto”, a Cura surge como um resgate da essência.

Ao criar um ambiente inclusivo e acessível, a iniciativa convida o público a deixar a performance de lado e a redescobrir o poder da conexão com a música e com as pessoas ao redor.


Como define o Daio Ruan, trata-se de “correlacionar esse conceito interpessoal com a música” — algo que, segundo ele, “tem um valor muito grande, principalmente para um mercado que, muitas vezes, só busca likes, streams e engajamento.”


É a partir deste amadurecimento que, após completar um ano de trajetória no dia 18 de novembro, a Cura Records inicia um novo ciclo.


Com o primeiro ano marcado por lançamentos, colaborações e pela construção das Cura Sessions, o selo apresenta o Healing, pensado para aprofundar essa mudança de direcionamento e estabelecer uma identidade própria para a noite.

O Healing surge como um desdobramento natural do novo momento do selo, apostando em uma proposta mais minimalista, voltada à introspecção e ao flow state. Conduzido por uma narrativa sonora profunda e progressiva, o formato convida o público a se deixar levar pela música.


O lançamento oficial acontece nesta sexta-feira, 19 de dezembro, às 20h, na Mercadoteca do Batel, com entrada gratuita.


Esta nova fase reafirma o antídoto que a Cura oferece e se apresenta como um convite para desacelerar.


Uma pausa para respirar, sentir e se reconectar com o que a música tem de mais essencial: a capacidade de unir.



Comentários


bottom of page